sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Boate Kiss - Uma reflexão


Por respeito, peço permissão a todas as famílias e amigos das mais de 230 vítimas do lamentável episódio.

Sempre que ocorre um evento de proporções absurdas como o incêndio na Boate Kiss em Santa Maria (RS) - com a perda de tantos jovens mal iniciando a vida - começam a aparecer as cobranças às autoridades, o descontentamento com as instituições, os xingamentos daqueles que se sentem traídos por políticos, policiais, bombeiros... Surgem também os iluminados de plantão, que se julgam conhecedores de tudo.

De outra parte, as autoridades correm para anunciar uma operação de fiscalização em casas noturnas e locais de grande aglomeração nas cidades. Algo que a princípio entendemos como positivo, mas que na verdade deve ser rotina, ato permanente.

É quando o óbvio se torna óbvio.

Nada contra. Tanto de um lado quanto de outro. Embora tardiamente, a fiscalização é bem-vinda. E quanto a nós cidadãos, devemos exercer os nossos direitos.

Quando falamos em cidadãos, incluímos também aqueles detentores de cargos políticos em todas as esferas de poder e os servidores públicos que respondem diretamente pela nossa segurança e bem-estar. Muito embora quase todas essas figuras ajam como se cidadãos não fossem.

Vivemos no Brasil. E por aqui parece mesmo que uns são mais ou menos cidadãos do que outros. Para alguns, apenas os direitos. Para outros, apenas os deveres. E carregamos todos nós a mesma dosagem tanto de um quanto de outro. Pode até parecer absurdo, mas há quem pense que não tem a obrigação de fazer valer os seus direitos (posto que me pertence, faço uso como e quando quiser). Só que, na medida em que abrimos mão, criamos brechas para que pessoas e/ou instituições pouco transparentes ou inescrupulosas possam se beneficiar. Já uma outra parte se esquece que a mesma determinação em exigir direitos vale também para o cumprimento de deveres. Em resumo, o cidadão tem o dever de fazer valer os seus direitos e a obrigação de cumprir com os seus deveres.

Somos a terra do “jeitinho”. Gostamos e queremos sempre levar vantagem. Achamos que aceitar propina não é crime, jogamos lixo na rua e depois choramos por ter perdido tudo com a forte chuva. Fingimos de égua quando a conta do bar, do restaurante, da boate ou seja lá o que for vem com valor abaixo do que foi efetivamente consumido, não devolvemos o dinheiro do troco a maior, e consideramos normal nos apoderarmos de um celular encontrado na rua (achado não é roubado). Transgredimos leis, estacionamos em fila dupla, utilizamos vagas destinadas a idosos e deficientes, e por aí vai.

Bandidos não nascem como tal. São transformados nisso. Se existe um "dono de boate" que não se preocupa com segurança, existe um “povo” que não se dá ao direito de se preocupar com isso e de se fazer respeitado como consumidor. Falta-nos essa cultura. Se existe um fiscal de prefeitura que concede alvará de funcionamento mediante propina é porque existe um "dono de boate" que acha normal pagar propina. O corruptor não sobrevive sem o corrupto e vice-versa. Falta-nos educação, vergonha na cara e honestidade. A educação (formal) não depende apenas do indivíduo, mas a honestidade e a vergonha vêm de berço. E de berço acalantado por pai e mãe e por governantes. Quando tivermos isso tudo, talvez nem tenhamos de cobrar de nossas autoridades, posto que elas saem da população, são crias da mesma mãe e do mesmo pai.

E deixo aqui para todos nós cidadãos, sem exceção, algo para refletir.

Atribuir responsabilidade exclusivamente aos governantes e àqueles investidos de poder para outorgar e fiscalizar não é também se desincumbir da própria responsabilidade?

Dos direitos, a grande maioria se lembra. Já os deveres... Bom, isso não é comigo!