terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O avião, a elite e as classes C e D



Definitivamente, o Brasil ainda é um país para poucos.  Não tem Brasil para todos os brasileiros.  E não há exemplo melhor do que o transporte aéreo para comprovar esta tese.

Durante décadas, viajar de avião era um glamour, um privilégio de uma minoria.  Viagens internacionais então, nem se fala.

Éramos bem tratados, desde o check-in, passando pelas refeições servidas a bordo, com o requinte de talheres em aço inox e até prata.  Mesmo em voos domésticos e de curta duração.

Há dez anos começaram a surgir empresas low cost low fare.  Com elas, a simplificação dos processos e a substituição das refeições mais elaboradas por barrinhas de cereal e pacotinhos de biscoito. Hoje em dia, nem isso.  Já tem empresas cobrando pela bebida e pelo lanche.

Custos menores, tarifas menores.  Com isso, um número maior de pessoas passou a utilizar o transporte aéreo.

No mesmo período o país saiu de quase duas décadas de estagnação e voltou a crescer.  Economia aquecida, aumento de renda, mais brasileiros nas filas de embarque.  O caos tinha data marcada para acontecer.  Afinal, nesses dez anos pouco ou nada foi feito para atender o crescimento da demanda.  Os aeroportos são exatamente os mesmos.

O resultado todos nós conhecemos.  Além dos problemas que já existiam, como a prática do over book, temos aeroportos super lotados, voos cancelados, atrasos, protestos, tripulação exaurida, xingamentos, depredações e maus tratos da parte de atendentes despreparados.

Bom, até aí, não vejo nada de estranho.  Pelo contrário, era previsível e até inevitável.  Impossível resolver simultaneamente todos os problemas do país.  Miséria e fome, infraestrutura, educação, saúde, segurança pública...  Abrindo um parêntese, é louvável que nesses últimos anos tenhamos evitado que milhões de brasileiros morressem de fome.  E embora eu não seja a Madre Tereza de Calcutá, penso nisso quando tenho de embarcar em um terminal lotado.

Mas o que mais me incomoda nessa história toda é ver uma meia dúzia de idiotas esbravejando contra o fato das classes C e D utilizarem o avião como meio de transporte.  Já ouvi coisas tão absurdas que tenho vergonha de escrever aqui.

É bem verdade que falta “bons modos” para essas pessoas que estão chegando agora. Natural, pois em função de terem sido mantidos à margem do "paraíso consumista", não têm hoje a menor familiaridade com o transporte aéreo.  Não sabem como se portar no momento do embarque.  Têm medo do Raio X.  E, pasmem, tem gente que sequer usa o banheiro por não saber abrir a porta.

Teremos de conviver com essa situação por algum tempo ainda.  Felizmente, vejo crianças pequenas nesse meio.  Logo elas crescerão, e diferente de seus pais, saberão muito bem ocupar os seus lugares e apertar os cintos.

E quanto à elite, só lamento.  Mais do que nunca, é preciso que ela também aperte o seu cinto. Mesmo que seja no pescoço.

Quem tiver muito dinheiro, compre um avião.  Quem tiver um pouco menos, alugue um táxi aéreo.  Para os demais, este é o país que temos agora.