terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Tinho e o enterro de um morto vivo

Muito já se ouviu sobre lendas tenebrosas a respeito de pessoas que teriam sido dadas como mortas e enterradas vivas durante um surto de catalepsia.  Especialistas, no entanto, garantem que isso é altamente improvável.  Se algo parecido ocorreu, de fato, só pode ter sido em um passado muito remoto.

Um desses episódios é contado e recontado em uma cidade do interior de Minas Gerais.  E por ser muito engraçado, resolvi compartilhar aqui.  Por respeito às pessoas - afinal, deve ser apenas uma lenda mesmo - os nomes são fictícios e a cidade é omitida.

Agripino, um cataléptico cinquentão, participava de uma partida de futebol entre amigos quando subitamente caiu paralisado.  Imediatamente, todos correram para socorrê-lo.  Um médico que estava no local logo se apresentou para examiná-lo.  Diagnóstico: estava morto.

A família, embora com alguma posse, passava por uma situação financeira difícil.  Mesmo assim, D. Vilma, a viúva, e seus cinco filhos fizeram questão de não medir esforços para dar ao marido e pai um sepultamento digno.  Tomaram dinheiro emprestado e capricharam em tudo, a começar pelo caixão.  Madeira de primeira, uma janela de vidro por onde se via do falecido o rosto e as mãos sobre o peito e tarraxas laterais para fechamento em metal dourado.

Final do velório.  Urna fechada e atarraxada.  D. Vilma, na porta da sala, chamou os filhos e um sobrinho para o adeus final.  Tinho, o sobrinho, era aquele sujeito que costumamos chamar de “espírito de porco”.

Um a um, eles foram se despedindo.  O último foi Tinho.  Olhar atento e bem próximo do vidro iniciou uma oração.  De repente, ele viu Agripino movimentar lentamente a mão direita, desentrelaçando-a da esquerda, e com o dedo indicador esticado, bater duas ou três vezes no vidro.  Assustado, Tinho esfregou os olhos como quem duvidava do que via.  E fazendo leitura labial, compreendeu o que o tio balbuciava:  me ti-ra da-qui...  Eu es-tou vi-vo.  O sobrinho meio ressabiado olhou para um lado, para o outro, mas não deixou ninguém perceber o que acontecia.  Respirou fundo, recompôs o semblante, aproximou-se o mais que pode do vidro e sem emitir nenhum som, caprichou no movimento dos lábios para calmamente dizer ao tio: ti-ro não...  Tia Vil-ma gas-tou o que ti-nha e o que não ti-nha ne-sse ve-ló-rio.  Enquanto se dirigia ao tio, cuidou de apertar ainda mais a tarraxa que estava à altura de sua mão.  E finalizou:  a-go-ra vo-cê es-tá mor-to mes-mo e se-rá en-te-rra-do!

Até hoje há controvérsia.  Uns dizem que Agripino permaneceu vivo por muito tempo e outros juram que ele foi enterrado vivo.